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Embora a legislação estabeleça uma cota para estimular a
participação feminina na política - a Lei nº 9.504/1997 estabelece que entre
30% e 70% das candidaturas aos cargos proporcionais sejam destinadas a um dos
gêneros -, a representação de mulheres no legislativo ainda é muito reduzida.
No Ceará, apenas 16% das vagas nas câmaras municipais serão ocupadas por
mulheres a partir do dia 1º de janeiro. Na atual legislatura, a ocupação
feminina nos legislativos municipais do Estado corresponde a apenas 17% das
cadeiras de vereadores.
O caminho para conseguir ocupar espaços na política
institucional é árduo - seja para conseguir se eleger ou mesmo para se manter
nos cargos. Vereadoras apontam que os desafios começam nos partidos,
normalmente mais preocupados em cumprir as cotas estabelecidas por lei do que
propriamente formar mulheres. Ao chegar na casa legislativa, porém, a situação
não é facilitada. O esforço para mostrar competência e pautar as lutas precisa
ser ainda maior que o dos homens.
O espaço que já é reduzido está ficando ainda mais restrito.
Embora as vagas nas câmaras municipais cearenses tenham aumentado do pleito de
2012 para o de 2016 (passou de 2.147 para 2.176, segundo dados do Tribunal
Superior Eleitoral), a quantidade de mulheres eleitas caiu de 366 para 360. Na
próxima legislatura, 23 dos 184 municípios do Ceará não terão nenhuma mulher no
poder legislativo, enquanto outras 54 cidades contarão com apenas uma
representante do gênero.
Outras 47 cidades terão apenas duas vereadoras, embora os
municípios com menos vagas na câmara tenham pelo menos nove cadeiras
disponíveis. A quantidade de cidades do Estado com uma representação equiparada
entre homens e mulheres é ínfima. Apenas cinco das 184 terão, a partir de
janeiro de 2017, praticamente o mesmo número de vereadores e vereadoras:
Apuiarés, Jaguaribara Moraújo, Pindoretama e Potengi.
Apuiarés, aliás, foi a única cidade do Ceará que elegeu mais
mulheres que homens: são quatro vereadores e cinco vereadoras que assumirão
mandato na Câmara Municipal no dia 1º de janeiro. Barbalha, que atualmente
dispõe de uma representante mulher no legislativo, não elegeu nenhuma para a
próxima legislatura.
Desafios
Mesmo quando as mulheres chegam a ocupar cargos na política
institucional, muitas vezes elas precisam contar com o estímulo e o apoio de
algum familiar que por algum motivo já não pode mais se candidatar. Outras, em
menor número, chegam depois de uma atuação política longa e independente nos
movimentos sociais, geralmente sem apoio expressivo dos partidos e da própria
sociedade. Todas elas - parlamentares em cidades grandes ou pequenas - precisam
assumir numerosos desafios para conquistar o próprio espaço em um ambiente
historicamente atribuído aos homens.
"Quando assumi o primeiro mandato, eu tive muita
dificuldade por ser mulher e jovem. Eu achava que era menos valorizada, então
estudava e me munia de argumentos. Eu achava que era menos valorizada. Hoje,
não me sinto mais assim", conta a vereadora Ana Nilma, que assume em
janeiro o quinto mandato na Câmara Municipal de Cedro. A cidade, localizada na
região Centro-sul do Estado, elegeu apenas duas vereadoras neste ano, metade
das que seguem com mandato até dezembro.
Cunhada do atual prefeito da cidade, Ana Nilma diz que
entrou na política pelo estímulo da família. "Entrei de uma forma natural,
sem maiores pretensões, mas me envolvi muito e acabei me apaixonando. Não me
vejo hoje sem um mandato, sem ter a confiança das pessoas, as ferramentas para
atuar por elas. Isso me impulsiona. Acho que a mulher é até mais comprometida
no parlamento, por se envolver mais com as questões", narra a parlamentar.
Hoje, ela vê sua atuação com certa independência e opina que
a desigualdade entre homens e mulheres na política institucional tem reduzido.
"Acho que a mulher precisa, na verdade, ousar mais. Eu não vejo mais tanta
desigualdade nessa questão. Talvez se a gente tivesse tido mais candidatas,
teríamos melhorado esse número. Agora, nesta última eleição, acho que o cenário
nacional, a questão da Dilma, respingou. O eleitor parece ter mais dificuldade
de confiar nas mulheres", diz.
Campanha dura
Ex-vereadora de Fortaleza, Eliana Gomes (PCdoB) concorda.
Ela já assumiu mandato na Câmara Municipal de Fortaleza, mas não conseguiu se
eleger para o cargo nem em 2012 nem neste ano, ficando apenas na suplência.
"É muito difícil e muito mais dura uma campanha para as mulheres,
principalmente as que não têm um padrinho ou um parentesco com um político. Eu
não tenho, meus pais eram operários. Vejo que, até mesmo para convencer uma
mulher a votar em outra, é complicado", diz.
Eliana Gomes acredita que a lei das cotas para as mulheres
não é suficiente para reduzir a desigualdade de gênero nos espaços
institucionais da política. "As mulheres precisam ser prioridade nos seus
partidos porque tudo é mais difícil para elas. O investimento é mais difícil de
conseguir, principalmente para as que não são de classe social mais alta.
Normalmente, as mulheres que chegam ao poder têm uma situação financeira
melhor", analisa.
Para a ex-vereadora, as mulheres precisam de apoio
partidário para se apropriar das políticas públicas e da luta que se dá nos
parlamentos. "A participação tem que ser fortalecida, não só no período de
campanha. Muitas mulheres da luta popular têm medo (de se candidatar) porque
acham que só quem tem recurso tem chance. O Parlamento é um espaço de decisão,
e as mulheres terão mais preocupação de pautar as lutas e as dificuldades
femininas que os homens", argumenta.
Eliana Gomes diz que viu integrantes da bancada feminina da
Câmara Municipal de Fortaleza desistirem da disputa deste ano por conta das
dificuldades de ocupar esse espaço. "Teve o impeachment da presidente, um
tumulto político. As mulheres já não têm mais aquela autoestima da eleição da
Dilma. Somos 52% do eleitorado, mas isso não é algo que se repete dentro dos
parlamentos. Além disso, as mulheres nem sempre são bem tratadas no
Legislativo. Vivemos em uma sociedade muito machista", lamenta.
Integrante do PCdoB, Eliana Gomes começou a militância política
no bairro aos 12 anos. "Foi quando conheci melhor a cidade de Fortaleza.
Na primeira vez que disputei, tive até uma votação expressiva. Fui pra
deputada, fiquei na suplência e não assumi. Depois, fui vereadora por quatro
anos. Agora, perdi por pouco. Minha atuação sempre foi em defesa das mulheres.
Queria que as mulheres vissem que também podem chegar na Câmara Municipal.
Somos 52% do eleitorado e necessitamos de representação", salienta.
Eliana diz que as mulheres até têm envolvimento político forte,
mas costumam ocupar espaços nas lideranças comunitárias, sindicatos e
movimentos sociais. "Nesta linha institucional, é mais difícil. E não
precisamos só ocupar o legislativo. Temos que ocupar também um espaço dentro
dos partidos pra formar opinião. A sociedade é muito machista, então ainda é
difícil convencer. Começamos a votar muito tarde, mas precisamos lutar",
diz a ex-vereadora.
Ela admite que conseguir uma vaga no legislativo não é
tarefa fácil, mas ressalta que desenvolver um mandato atuante é ainda mais
difícil. "Senti dificuldade. É complicado pra uma vereadora chegar naquele
espaço de poucas mulheres, e mesmo assim a maioria delas colocadas ali por
parentes. Se uma popular chega, ela tem que fazer o melhor. Não pode ter medo
de usar tribuna. Eu fazia o enfrentamento político", declara.
Conforme Eliana Gomes, até mesmo a questão física deixa a
mulher atrás dos homens no momento de fazer campanha e disputar cargos
eletivos. "O sentimento é de que, muitas vezes, nós, mulheres, não temos a
mesma energia. Mas não é verdade. É muito importante as mulheres estarem nos
espaços de poder. Cada vez mais partidos devem investir nas mulheres, com
formações e investimentos".
Iniciativas do Poder Judiciário buscam fomentar a presença
da mulher na política. A Lei das Eleições determina, por exemplo, que o
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) deve promover propaganda institucional em
rádio e televisão, destinada a incentivar a participação feminina na política,
de 1º de abril a 30 de julho dos anos eleitorais.
por Beatriz Jucá -
Repórter
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